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Porto Velho, RO - Vladimir Efimov, um político local na península de Kamchatka, no Extremo Oriente da Rússia, foi acusado de “desacreditar o exército” e condenado a pagar uma multa de US$ 500 três vezes nos últimos meses por imagens contra a guerra na Ucrânia que exibiu nas redes sociais.
Quando ele continuou republicando fotos do campo de batalha, como a destruição em massa da cidade portuária ucraniana de Mariupol sob bombardeio russo, os promotores o acusaram de crime — punível com até cinco anos de prisão ou multas mais duras.
Pelo menos 50 pessoas enfrentam sentenças de prisão de até 10 anos ou cinco anos de trabalhos forçados, ou multas de até US$ 77 mil, por divulgar “informações falsas” sobre os militares russos. Mais de 2 mil pessoas foram acusadas de infrações menores, de acordo com uma organização de direitos humanos que acompanha casos em todo o país.
— Eles pensaram que eu teria medo, que as multas fariam eu me esconder — disse Efimov.
Três meses atrás, o presidente russo, Vladimir Putin, sancionou medidas draconianas destinadas a silenciar os críticos de guerra, condenando até mesmo o uso da palavra “guerra”. Eles levaram alguns russos a fugir do país, horrorizados com a invasão, forçaram os meios de comunicação independentes a fechar as portas e criaram um clima de suspeita em que vizinho se voltava contra vizinho.
Embora as leis inicialmente tenham levado a alguns poucos casos altamente divulgados, agora está ficando claro que os promotores locais em todo o país estão aplicando-as com mais zelo.
As acusações que se acumulam contra ativistas, políticos, jornalistas e russos comuns nas grandes cidades e vilas remotas de Kamchatka, no extremo Oriente, a Kaliningrado, no Oeste, mostram como o Kremlin intensificou a repressão daqueles que criticam a guerra.
— Claramente, o objetivo era ter um efeito assustador no público e em quaisquer vozes críticas contra a operação militar — disse Pavel Chikov, chefe do Agora Human Rights Group, que registrou os casos e ajudou a defender alguns dos acusados. — Até certo ponto, foi bem-sucedido, porque as pessoas são meio cautelosas sobre como expressam suas opiniões.
As duas leis tratam de ações ligeiramente diferentes. A mais dura criminalizou a divulgação deliberada de “informações falsas” sobre os militares, interpretadas como qualquer coisa fora da versão oficial dos eventos. Se as ações causarem “graves consequências” indefinidas, a sentença vai até 15 anos de prisão ou multa de US$ 80 mil.
A segunda lei proibiu praticamente qualquer protesto ou crítica pública à guerra ou “desacreditando” os militares. Há multas para os incidentes iniciais, enquanto os infratores reincidentes enfrentam acusações criminais que acarretam penas de prisão de até cinco anos ou penalidades financeiras. Até o momento, quatro casos criminais surgiram entre os 2 mil acusados, mas os números devem aumentar, disse Chikov.
— Se falarmos de casos envolvendo liberdade de expressão, eu diria que é o maior número de todos os tempos — acrescentou.
Com os primeiros casos criminais chegando a julgamento, ainda não está claro com que severidade os juízes — geralmente propensos a seguir a linha do Kremlin — tratarão os réus. Os advogados de defesa não estão otimistas.
— Gostaria de esperar que os tribunais sejam justos e ouçam nossos argumentos — disse Marina Yankina, advogada de um jornalista freelancer no Sudoeste da Sibéria cujo julgamento começou na quarta-feira. — Mas estou trabalhando há muito tempo e, infelizmente, isso não vai acontecer.
As acusações contra seu cliente, Andrei Novashov, 45 anos, de uma pequena cidade chamada Prokopyevsk, são um bom exemplo. Novashov disse que ficou surpreso ao ser acusado de espalhar "informações falsas" em cinco postagens nas redes sociais, incluindo uma repostagem de um conhecido fotojornalista sobre os militares russos destruindo uma maternidade em Mariupol.
Os policiais começaram a arrombar sua porta às seis da manhã, como se ele fosse “um traficante de drogas ou cafetão”, disse ele. Como a maioria dos réus, Novashov foi impedido pelo juiz de usar a internet ou seu telefone, mas conseguiu falar com um podcaster local.
— É impossível ficar calado — disse, enquanto observava com pesar que as pessoas da cidade reagiram ao seu caso com indiferença. — As pessoas foram ensinadas a acreditar que nada vai mudar, então quanto menos você souber, melhor você dormirá.
Em um eco dos tempos stalinistas, as novas leis estimularam as pessoas a entregar seus concidadãos. Depois que Aleksei Gorinov, 61 anos, um político local em Moscou, criticou publicamente os eventos do Dia da Vitória para crianças, quando crianças ucranianas estavam morrendo, cinco russos o denunciaram à polícia, disse seu advogado, Sergei N. Telnov.
As autoridades iniciaram o caso contra Gorinov em 25 de abril, o levaram para a prisão em 27 de abril e emitiram uma acusação em 1º de maio, disse Telnov, acrescentando que o processo "é super rápido". Gorinov foi acusado de espalhar informações falsas, incluindo chamar o conflito de “guerra”, já que oficialmente Moscou continua chamando a invasão de uma “operação militar especial”.
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Ucrânia x Rússia: Entenda como a crise se transformou numa guerra — Foto: Infoglobo () - 6- Comercialização e republicação controladas
Em uma das primeiras sentenças a serem proferidas, um tribunal da região de Zabaikalsky, perto da fronteira com a China, multou o administrador de um canal de mídia social chamado “I Live in Ruins” em cerca de US$ 16 mil esta semana depois que ele foi acusado de postar mensagens falsas documentos e vídeos que continham informações sobre operações militares na Ucrânia, de acordo com um site local.
Chikov diz que as novas leis foram inspiradas nas criadas durante a pandemia, quando o governo proibiu a divulgação de informações sobre a Covid que não havia aprovado. Mas apenas nove pessoas foram processadas em dois anos, disse ele.
Não é preciso muito para ser acusado de “desacreditar” os militares. Os russos foram processados por usar roupas de ginástica e até esmalte nas cores azul e amarelo da bandeira ucraniana, disseram advogados. Uma advogada em Kaliningrado enfrentou a mesma acusação depois de usar a palavra “guerra” em seus argumentos defendendo um cliente.
A crescente lista de casos em toda a Rússia indica que os promotores perceberam que Moscou queria resultados, disseram advogados.
— Há um sentimento de que há uma diretriz para levar os casos ao tribunal o mais rapidamente possível — disse Chikov. — Todo mundo imediatamente entendeu que isso era da mais alta prioridade política.
Ainda assim, o fluxo constante de novos casos sinalizou que as leis não silenciaram toda a oposição, acrescentou.
Em Kamchatka, uma península pouco povoada no norte do Pacífico, Efimov chefia a filial local do Yabloko, um partido de oposição em declínio. Seus posts antiguerra não criticavam os militares, segundo ele, mas a “histeria” em massa em apoio à guerra. Efimov prometeu continuar apesar das acusações criminais.
— ‘Senta aí, cala a boca e elogia o presidente’, é disso que se trata — disse.
Pelo menos 50 pessoas enfrentam sentenças de prisão de até 10 anos ou cinco anos de trabalhos forçados, ou multas de até US$ 77 mil, por divulgar “informações falsas” sobre os militares russos. Mais de 2 mil pessoas foram acusadas de infrações menores, de acordo com uma organização de direitos humanos que acompanha casos em todo o país.
— Eles pensaram que eu teria medo, que as multas fariam eu me esconder — disse Efimov.
Três meses atrás, o presidente russo, Vladimir Putin, sancionou medidas draconianas destinadas a silenciar os críticos de guerra, condenando até mesmo o uso da palavra “guerra”. Eles levaram alguns russos a fugir do país, horrorizados com a invasão, forçaram os meios de comunicação independentes a fechar as portas e criaram um clima de suspeita em que vizinho se voltava contra vizinho.
Embora as leis inicialmente tenham levado a alguns poucos casos altamente divulgados, agora está ficando claro que os promotores locais em todo o país estão aplicando-as com mais zelo.
As acusações que se acumulam contra ativistas, políticos, jornalistas e russos comuns nas grandes cidades e vilas remotas de Kamchatka, no extremo Oriente, a Kaliningrado, no Oeste, mostram como o Kremlin intensificou a repressão daqueles que criticam a guerra.
— Claramente, o objetivo era ter um efeito assustador no público e em quaisquer vozes críticas contra a operação militar — disse Pavel Chikov, chefe do Agora Human Rights Group, que registrou os casos e ajudou a defender alguns dos acusados. — Até certo ponto, foi bem-sucedido, porque as pessoas são meio cautelosas sobre como expressam suas opiniões.
As duas leis tratam de ações ligeiramente diferentes. A mais dura criminalizou a divulgação deliberada de “informações falsas” sobre os militares, interpretadas como qualquer coisa fora da versão oficial dos eventos. Se as ações causarem “graves consequências” indefinidas, a sentença vai até 15 anos de prisão ou multa de US$ 80 mil.
A segunda lei proibiu praticamente qualquer protesto ou crítica pública à guerra ou “desacreditando” os militares. Há multas para os incidentes iniciais, enquanto os infratores reincidentes enfrentam acusações criminais que acarretam penas de prisão de até cinco anos ou penalidades financeiras. Até o momento, quatro casos criminais surgiram entre os 2 mil acusados, mas os números devem aumentar, disse Chikov.
— Se falarmos de casos envolvendo liberdade de expressão, eu diria que é o maior número de todos os tempos — acrescentou.
Com os primeiros casos criminais chegando a julgamento, ainda não está claro com que severidade os juízes — geralmente propensos a seguir a linha do Kremlin — tratarão os réus. Os advogados de defesa não estão otimistas.
— Gostaria de esperar que os tribunais sejam justos e ouçam nossos argumentos — disse Marina Yankina, advogada de um jornalista freelancer no Sudoeste da Sibéria cujo julgamento começou na quarta-feira. — Mas estou trabalhando há muito tempo e, infelizmente, isso não vai acontecer.
As acusações contra seu cliente, Andrei Novashov, 45 anos, de uma pequena cidade chamada Prokopyevsk, são um bom exemplo. Novashov disse que ficou surpreso ao ser acusado de espalhar "informações falsas" em cinco postagens nas redes sociais, incluindo uma repostagem de um conhecido fotojornalista sobre os militares russos destruindo uma maternidade em Mariupol.
Os policiais começaram a arrombar sua porta às seis da manhã, como se ele fosse “um traficante de drogas ou cafetão”, disse ele. Como a maioria dos réus, Novashov foi impedido pelo juiz de usar a internet ou seu telefone, mas conseguiu falar com um podcaster local.
— É impossível ficar calado — disse, enquanto observava com pesar que as pessoas da cidade reagiram ao seu caso com indiferença. — As pessoas foram ensinadas a acreditar que nada vai mudar, então quanto menos você souber, melhor você dormirá.
Em um eco dos tempos stalinistas, as novas leis estimularam as pessoas a entregar seus concidadãos. Depois que Aleksei Gorinov, 61 anos, um político local em Moscou, criticou publicamente os eventos do Dia da Vitória para crianças, quando crianças ucranianas estavam morrendo, cinco russos o denunciaram à polícia, disse seu advogado, Sergei N. Telnov.
As autoridades iniciaram o caso contra Gorinov em 25 de abril, o levaram para a prisão em 27 de abril e emitiram uma acusação em 1º de maio, disse Telnov, acrescentando que o processo "é super rápido". Gorinov foi acusado de espalhar informações falsas, incluindo chamar o conflito de “guerra”, já que oficialmente Moscou continua chamando a invasão de uma “operação militar especial”.
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Ucrânia x Rússia: Entenda como a crise se transformou numa guerra — Foto: Infoglobo () - 6- Comercialização e republicação controladas
Em uma das primeiras sentenças a serem proferidas, um tribunal da região de Zabaikalsky, perto da fronteira com a China, multou o administrador de um canal de mídia social chamado “I Live in Ruins” em cerca de US$ 16 mil esta semana depois que ele foi acusado de postar mensagens falsas documentos e vídeos que continham informações sobre operações militares na Ucrânia, de acordo com um site local.
Chikov diz que as novas leis foram inspiradas nas criadas durante a pandemia, quando o governo proibiu a divulgação de informações sobre a Covid que não havia aprovado. Mas apenas nove pessoas foram processadas em dois anos, disse ele.
Não é preciso muito para ser acusado de “desacreditar” os militares. Os russos foram processados por usar roupas de ginástica e até esmalte nas cores azul e amarelo da bandeira ucraniana, disseram advogados. Uma advogada em Kaliningrado enfrentou a mesma acusação depois de usar a palavra “guerra” em seus argumentos defendendo um cliente.
A crescente lista de casos em toda a Rússia indica que os promotores perceberam que Moscou queria resultados, disseram advogados.
— Há um sentimento de que há uma diretriz para levar os casos ao tribunal o mais rapidamente possível — disse Chikov. — Todo mundo imediatamente entendeu que isso era da mais alta prioridade política.
Ainda assim, o fluxo constante de novos casos sinalizou que as leis não silenciaram toda a oposição, acrescentou.
Em Kamchatka, uma península pouco povoada no norte do Pacífico, Efimov chefia a filial local do Yabloko, um partido de oposição em declínio. Seus posts antiguerra não criticavam os militares, segundo ele, mas a “histeria” em massa em apoio à guerra. Efimov prometeu continuar apesar das acusações criminais.
— ‘Senta aí, cala a boca e elogia o presidente’, é disso que se trata — disse.
Fonte: O GLOBO