Pauta econômica do STF, que vai decidir sobre FGTS e Lei das Estatais, leva governo a ‘corpo a corpo’ com ministros

Pauta econômica do STF, que vai decidir sobre FGTS e Lei das Estatais, leva governo a ‘corpo a corpo’ com ministros

Casos têm o potencial de exigir uma maior articulação política do governo, que precisará agir para evitar reveses na Corte

Com o início do ano no Judiciário ontem, o Supremo Tribunal Federal (STF) se prepara para julgar, no primeiro semestre deste ano, casos que representam um desafio para o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Nessa lista, estão ações que questionam a taxa de correção do FGTS e a indicação de políticos para estatais, como a Petrobras, além de recursos da União contra decisão tomada pela Corte na chamada “revisão da vida toda” do INSS.

Ministros do governo, como Jorge Messias (advogado-geral da União) e Fernando Haddad (Fazenda), devem fazer um “corpo a corpo” no STF. Em meio a uma relação de grande harmonia entre o governo federal e o Supremo, que tem sido considerado um aliado do Executivo em contendas entre os poderes, estes casos têm o potencial de exigir uma maior articulação política do governo, que precisará agir para evitar reveses na Corte.

A Advocacia-Geral da União (AGU) e os ministros das áreas envolvidas com os temas da pauta de julgamento do Supremo farão um esforço concentrado para minimizar impactos das decisões nas contas públicas e até mesmo anular os processos.

O primeiro desses temas que será enfrentado pelo Supremo diz respeito à revisão da vida toda do INSS. Os ministros vão decidir se haverá alterações na decisão da própria Corte. Em 2022, o STF permitiu a aposentados que entraram na Justiça pedir o recálculo do benefício com base em todas as contribuições feitas ao longo da vida.

Apesar da decisão do Supremo de 2022, a revisão da vida toda ainda não é aplicada devido a um recurso do INSS. Ontem, enquanto a sessão solene de reabertura do Judiciário ocorria, manifestantes na Praça dos Três Poderes pediam para que a revisão fosse de fato implementada.

A AGU vai lutar para anular a decisão, alegando que o tema passou pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) sem ter sido apreciado por um colegiado especial. Se não conseguir anular e devolver o caso ao STJ, o plano é limitar a decisão a aposentadorias por tempo de serviço, sem abranger demais benefícios do INSS.

Segundo um estudo da Secretaria de Previdência realizado em 2022, o impacto no sistema previdenciário seria de R$ 46 bilhões em dez anos, considerando apenas aposentadorias por tempo de serviço. Já cálculos do INSS apontam impacto entre R$ 120 bilhões e R$ 360 bilhões nesse período, se a decisão alcançar todos os benefícios.

Os recursos estavam sendo analisados pelo plenário virtual da Corte, mas um pedido de destaque do ministro Alexandre de Moraes, em dezembro, levou o caso para a análise no plenário físico.

Presença de Dino

Nesse julgamento, não haverá participação do ministro Flávio Dino, que toma posse no dia 22. Mas outros dois temas que causam preocupação no Planalto já contarão com a nova composição do Supremo em suas análises.

Ainda sem data marcada para ocorrer, o julgamento sobre a taxa de correção do FGTS é acompanhado com lupa pelo governo, que teme que eventual decisão do Judiciário cause um impacto nas contas públicas. No final de 2023, a AGU chegou a pedir para que o caso fosse retirado de pauta e anunciou a busca de uma solução de consenso — o que ainda não ocorreu de forma concreta.

Até o momento, três ministros votaram para assegurar que o conjunto da remuneração do FGTS seja, no mínimo, igual ao da poupança, mas com efeitos para depósitos efetuados a partir de 2025. Como regra de transição aplicável em 2023 e 2024, o governo, além de pagar taxa referencial (TR) e 3% de juros, deverá distribuir a integralidade do resultado do fundo aos correntistas.

O governo “não jogou a toalha” em relação a mudanças, de acordo com integrantes do Executivo, apesar de o relator, ministro Luís Roberto Barroso, insistir na remuneração da caderneta de poupança, ainda que a partir de 2025 e novos depósitos.

A estratégia da AGU é reforçar o argumento de que o STJ já decidiu por unanimidade que a sistemática atual de divisão do lucro do FGTS com cotistas é legítima. A ação foi apresentada em 2014, mas em 2017 o governo passou a dividir com os trabalhadores o lucro do FGTS, disse um técnico a par do debate.

Outro argumento é que a medida vai prejudicar políticas públicas financiadas pelo FGTS, como o Minha Casa, Minha Vida.

Estatais: tarefa difícil

Para aumentar a correção das contas será preciso subir os juros dos financiamentos. A estimativa é que o Fundo terá um custo anual estimado em R$ 31 bilhões, o que retiraria do Orçamento da habitação R$ 3 bilhões por ano.

O julgamento da correção do FGTS foi suspenso por pedido de vista do ministro Cristiano Zanin, que será o primeiro a votar quando o julgamento for retomado.

Em outro processo de grande interesse para o governo, Dino também deverá atuar como voto fundamental: o que pode derrubar limitações à indicação de políticos para estatais. As normas proíbem expressamente a indicação para os cargos das estatais de ministros de Estado, secretários estaduais e municipais e titulares de cargo de natureza especial ou de direção e assessoramento superior na administração pública.

Para o Partido Comunista do Brasil (PCdoB), autor da ação, as regras contrariam os direitos constitucionais à isonomia e à autonomia partidária.

O julgamento começou em março, em sessão virtual, com o voto do relator, ministro Ricardo Lewandowski (aposentado), no sentido de invalidar a regra.

O governo alega que serão mantidas outras exigências que melhoram a gestão das empresas públicas, como experiência e conhecimento na área. Porém, a tarefa será difícil, admitem técnicos, por causa da opinião pública, das críticas de especialistas e de receios dos ministros de que a flexibilização resulte em aparelhamento da máquina pública, repetindo problemas do passado na gestão petista.

No STF, os movimentos do governo em busca de soluções mais de acordo com seus interesses são encarados com naturalidade. A avaliação é que os “julgamentos espinhosos” não devem desgastar a relação com o Executivo.


Fonte: O GLOBO

Postar um comentário

Please Select Embedded Mode To Show The Comment System.*

Postagem Anterior Próxima Postagem