Para um terço dos brasileiros, universidades públicas deveriam cobrar mensalidade de quem pode pagar, indica pesquisa

Para um terço dos brasileiros, universidades públicas deveriam cobrar mensalidade de quem pode pagar, indica pesquisa

Levantamento da Genial/Quaest também mostra que, para 65% da população, governo deveria investir mais na educação básica do que nas universidades

Um terço dos brasileiros (33%) defende que as universidades públicas passem a cobrar mensalidade de estudantes com condições financeiras de pagá-la. Em contrapartida, 64% — ou seja, a maioria —respalda a continuidade da gratuidade para todos os cidadãos, sem distinção. Os números são de um levantamento da Genial/Quaest obtido com exclusividade pelo GLOBO.

A proposta de implementar mensalidades é mais bem recebida pelos eleitores que votaram no ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) no segundo turno das eleições de 2022.

— A defesa da cobrança de mensalidades dentro das universidades públicas para quem tem condições de pagar revela a divisão ideológica sobre a educação no país. Entre os eleitores do Lula, mais pró-estado, apenas 27% defendem a introdução de um mecanismo de pagamento dentro das universidades. Já entre os eleitores de Bolsonaro, mais pró-mercado, quase 45% defendem a cobrança — explica Felipe Nunes, diretor da Quaest e professor da Universidade Federal de Minas Gerais.

Maioria defende universidades públicas sem mensalidade — Foto: Quaest

Em 2022, durante o governo Bolsonaro, a cobrança de mensalidades em universidades públicas voltou ao debate público com a possibilidade de uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) sobre o tema ser debatida na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara dos Deputados, o que acabou não acontecendo.

Três anos antes, o então ministro da educação, Abraham Weintraub, chegou a sugerir o pagamento de mensalidades em cursos de pós-graduação nas instituições federais, mas acabou desautorizado por Bolsonaro, que disse que a medida poderia fazer com que alunos de família com renda mais alta saíssem do país para estudar no exterior.

Maioria defende universidades públicas sem mensalidade — Foto: Quaest

A pesquisa da Quaest também perguntou aos brasileiros sobre o Fundo de Financiamento Estudantil (Fies) e o Programa Universidade Para Todos (Prouni), ambas bandeiras dos governos do PT. Resultado: 68% defendem que o governo invista mais nas duas iniciativas (72% entre os eleitores de Lula; 62% entre os apoiadores de Bolsonaro). A mesma parcela acredita que o governo Lula deveria voltar com o programa de bolsas para brasileiros estudarem no exterior.

Opinião de eleitores de Lula e Bolsonaro sobre duas políticas educacionais — Foto: Quaest

Prioridade à educação básica

Se a cobrança de mensalidade em universidades públicas divide eleitores de Bolsonaro e de Lula, há certo consenso quanto à ideia de que o governo deveria investir mais na educação básica do que nas universidades. No total, 84% dos brasileiros estão de acordo em direcionar foco para a educação infantil e os ensinos fundamental e médio, sendo que, destes, 65% concordam integralmente com essa abordagem e 19% parcialmente. No eleitorado de Lula, a concordância alcança 80%, enquanto os eleitores de Bolsonaro endossam até mais a ideia, com 87% de apoio.

Opinião de eleitores de Lula e Bolsonaro sobre investimento em educação básica — Foto: Quaest

Há também convergência dos dois grupos sobre a necessidade de o governo priorizar a criação de um programa de ensino médio integral. Considerando o voto no segundo turno, 88% dos eleitores de Lula apoiam essa proposta, percentual que fica em 84% entre os eleitores de Bolsonaro.

Opinião dos eleitores de Lula e Bolsonaro sobre o ensino médio integral — Foto: Quaest

— A pesquisa tem um recado muito claro: educação gratuita e de qualidade é prioridade para o brasileiro. E mais: o país deveria investir mais na educação básica, priorizar a criação de programas de ensino médio integral e a retomada do Fies e do Prouni. Ou seja, o brasileiro que usa o sistema público de educação sabe muito bem o que quer, porque sabe bem o que precisa —diz Felipe Nunes.

Olavo Nogueira, diretor executivo do Todos pela Educação, chama atenção para o fato de a prioridade à educação básica e ao tempo integral serem pautas que não dividem o eleitorado do país.

— E no espírito de buscar pautas positivas para o país e que, ao mesmo tempo, contribuam para arrefecer a chamada polarização afetiva que se instalou no Brasil nos últimos anos, estão aí dois possíveis caminhos — afirma Nogueira.

O especialista explica que, no caso da educação básica, o desejo de parcela expressiva da população brasileira por mais investimentos frente ao ensino superior tem respaldo na comparação com muitos países.

—Nas nações mais desenvolvidas, na média o investimento per capita no ensino superior é aproximadamente o dobro do que o investimento per capita no Ensino Básico. No Brasil, a proporção é de quatro vezes. Mas há 20 anos essa diferença foi 11 vezes maior, ou seja, ela vem diminuindo nos últimos anos, o que é bom — explica Nogueira.

O diretor executivo do Todos pela Educação reforça, no entanto, que se o objetivo é promover o desenvolvimento do país, priorizar a educação básica não deveria significar um desfinanciamento do ensino superior, que já carece de recursos: "muito antes de promover uma disputa de financiamento entre Educação Básica e Ensino Superior, os executivos e legislativos do país deveriam fazer a disputa orçamentária em favor da educação de modo geral" Ele ainda acrescenta que o Ministério da Educação (MEC), sob Camilo Santana, tem demonstrado estar alinhado com o que pensa a população neste tema.

— Olhando para a última década, fica evidente a ênfase nas políticas de ensino superior, com o avanço do Fies, do Prouni, com o Enem se transformando numa grande porta de entrada ao ensino superior. Agora, o fato de o presidente Lula ter chamado para a liderança do MEC um ex-governador cuja trajetória é marcada por sucessos na educação básica mostra uma mensagem importante e que felizmente tem se concretizado em termos de prioridades da pasta— completa Nogueira.

A pesquisa Genial/Quaest ouviu 2.000 pessoas de forma presencial entre os dias 14 e 18 de dezembro do ano passado. A margem de erro é de dois pontos percentuais para mais ou para menos, e o nível de confiança de 95%.


Fonte: O GLOBO

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