Dezenas de decisões de Moraes com base no órgão do TSE constam em relatório divulgado na quarta-feira (17) por uma comissão do Congresso dos Estados Unidos
Porto Velho, RO. O ministro Alexandre de
Moraes derrubou uma série de perfis nas redes sociais e determinou
exclusão de conteúdos da internet com base em pedidos de um órgão
chefiado por ele mesmo após tomar posse como presidente do TSE (Tribunal
Superior Eleitoral).
Dezenas de decisões de Moraes com base no
órgão do TSE constam em relatório divulgado na quarta-feira (17) por
uma comissão do Congresso dos Estados Unidos. O colegiado do Legislativo
americano obteve as ordens judiciais e as publicou após intimação
parlamentar feita ao X, o antigo Twitter, chefiado pelo bilionário Elon
Musk, que protagonizou embates públicos com Moraes nos últimos dias.
A
chamada Assessoria Especial de Enfrentamento à Desinformação foi criada
na gestão do ministro Edson Fachin, em 2022. O delegado da Polícia
Federal José Fernando Chuy foi escolhido para comandar o setor. O órgão
detém a atribuição de monitoramento das redes sociais, identificava
publicações "irregulares" e encaminhava os casos para Moraes avaliar e,
então, determinar a retirada do ar "com urgência".
O trabalho da
assessoria também serviu para Moraes turbinar inquéritos do STF
(Supremo Tribunal Federal) que apuram disseminação de fake news e
suposta tentativa de golpe de Estado do ex-presidente Jair Bolsonaro
(PL) e seus aliados.
Os documentos anexados no relatório
divulgado nos Estados Unidos mostram também que o ministro também tomou
ao menos uma decisão no STF com base no órgão do TSE, além de determinar
a remessa de casos perante a corte eleitoral a inquéritos do Supremo
sob sua própria relatoria.
O relatório da comissão do Legislativo
americano ignora os ataques bolsonaristas às instituições que
culminaram nos atos golpistas de 8 de janeiro.
Aliados do
ex-presidente têm usado o documento para criticar o STF e defender a
instalação de uma CPI para investigar a atuação da corte, em especial de
Moraes.
Entre aliados do presidente Lula (PT), há uma tentativa
de ignorar o impacto dos documentos no embate político e de amenizar as
críticas à atuação de Moraes.
O Supremo, por sua vez, reagiu e
soltou nota nesta quinta-feira (18) para falar das decisões reveladas,
que demonstram que eram encaminhadas às plataformas apenas a ordem para
suspensão de conteúdos, sem uma justificativa para tal medida.
O
texto divulgado pela corte afirma que "não se trata das decisões
fundamentadas que determinaram a retirada de conteúdos ou perfis, mas
sim dos ofícios enviados às plataformas para cumprimento da decisão".
A
nota diz que "todas as decisões tomadas pelo STF são fundamentadas,
como prevê a Constituição, e as partes, as pessoas afetadas, têm acesso à
fundamentação".
O relatório em questão, produzido pela comissão
parlamentar, foi intitulado como "O ataque contra a liberdade de
expressão no exterior e o silêncio da administração Biden: o caso do
Brasil". O colegiado é presidido pelo deputado Jim Jordan, polêmico
republicano fortemente ligado ao ex-presidente Donald Trump -ídolo do
bolsonarismo.
O documento tem 541 páginas com considerações
gerais, 28 ordens judiciais (em português e em inglês) de Alexandre de
Moraes ao X (antigo Twitter), outras 23 ordens do ministro sem tradução
para o inglês e mais 37 documentos expedidos pelo TSE.
No TSE,
geralmente, apenas depois de suspender as publicações é que o ministro
remetia os casos à Procuradoria-Geral Eleitoral -que integra o
Ministério Público e, em tese, seria a instituição responsável por
apurar crimes relativos às eleições.
Uma ordem para exclusão de
conteúdo com base na assessoria do TSE atingiu também o site de notícias
UOL -empresa em que o Grupo Folha possui participação minoritária. Em
20 de novembro de 2022, ordem do juiz auxiliar de Moraes, Marco Antonio
Martin Vargas, determinou a retirada do ar de uma publicação do UOL no X
com o link de reportagem da Folha sobre o vazamento de dados do
ministro em grupos de militantes do ex-presidente Bolsonaro.
A
reportagem não continha nenhuma informação pessoal do magistrado, apenas
relatava a circulação desses dados entre bolsonaristas.
A
decisão afirma que após o vazamento Moraes recebeu centenas de ligações e
diz que se verificou no caso "o compartilhamento irregular de dados
pessoais com a finalidade inequívoca de transferir, para a pessoa do
ministro presidente, os ataques institucionais com base em desinformação
que afetam a integridade do processo eleitoral".
Cinco dias depois, o mesmo juiz recuou e mandou liberar a publicação, sem maiores esclarecimentos.
"Diante
da informação prestada pela Assessoria Especial de Enfrentamento à
Desinformação, reconsidero a decisão para fazer excluir a matéria do
jornal Folha de São Paulo, pelo perfil @UOLNoticias", diz o documento.
O UOL, por meio de seu setor jurídico, informou que não foi notificado sobre a decisão do TSE.
Foi
na mesma ordem de retirada do conteúdo do UOL que o magistrado relata
que o blogueiro bolsonarista Allan dos Santos publicou um vídeo em que
telefona para Moraes e deixa aparecer o número do contato do ministro.
"As
ligações em questão, que somaram centenas, foram recebidas por meio de
ligações telefônicas e do aplicativo de mensagem WhatsApp", diz a
decisão.
O TSE não se manifesta sobre o teor dessa ordem, e o caso permanece em sigilo até hoje.
As
outras decisões com base no trabalho da Assessoria Especial de
Enfrentamento à Desinformação atingiram políticos conhecidos da direita
no Brasil, como os deputados federais Marcel Van Hatten (Novo-RS) e
Carla Zambelli (PL-SP).
Na decisão, Moraes ou seu juiz auxiliar costumavam relatar o que foi encontrado.
"A
Assessoria Especial de Enfrentamento a Desinformação informa a que, a
partir de atividades de monitoramento de dados abertos de mídias
sociais, detectou a realização de manifestações públicas em publicações
na plataforma Twitter, Facebook, Instagram, Telegram, WhatsApp, Youtube,
TikTok, Getter e Linkedln baseadas em afirmações falsas ou gravemente
descontextualizadas, que atingem a normalidade e a integridade as
eleições, incentivando a recusa dos resultados e fazendo apologia a um
golpe militar", diz em uma das decisões.
por Folhapress