'Acabou a era da passagem de avião barata. Agora, só com promoção’, diz presidente da TAP

'Acabou a era da passagem de avião barata. Agora, só com promoção’, diz presidente da TAP

Luís Rodrigues diz que oferta de aviões é descasada da demanda pós-pandemia e que saída para os consumidores é planejar viagem com antecedência. Aérea portuguesa pode ser privatizada após eleição

O mercado brasileiro já responde por um terço da operação da TAP Portugal que voa para 90 destinos em 37 países. A companhia aérea portuguesa vai ampliar os voos para o país para 91 este ano, com presença em 11 capitais.

Luís Rodrigues, CEO da empresa, afirma que o cenário para o setor é de demanda aquecida na compra por bilhetes e oferta restrita de aviões no mercado, o que inevitavelmente se traduz em preços mais altos. Ele avalia que a única saída para o consumidor é programar viagens a lazer com antecedência para obter bilhetes mais em conta.

Em passagem pelo Brasil, o executivo visitou a Embraer, embora a TAP não possa ampliar a frota até 2025, em razão de acordo firmado com a Comissão Europeia, como parte de sua reestruturação.

A companhia deve ter seu futuro definido após a eleição em Portugal, marcada para março. O governo pode optar por privatizar a TAP ou vender uma fatia de seu capital ao setor privado. Na avaliação do executivo, o mais importante é se livrar das amarras de empresa pública. Veja trechos da entrevista abaixo:

Aviões da TAP Portugal no aeroporto de Lisboa — Foto: Patrícia de Mello Moreira/AFP

Qual é o perfil do brasileiro que viaja de TAP hoje?

Vamos ter no verão (europeu) 91 frequências semanais entre Lisboa, Porto e Brasil. São pessoas que fazem turismo, ficam em Portugal ou vão para o resto da Europa. Há muitos residentes. Há cidades em Portugal, como Braga, onde a população brasileira representa 15% da comunidade.

Depois da pandemia a demanda por viagens aumentou muito. Como veem a questão do preço?

Quando olhamos para a frente, para reservas, não vemos crise. Vemos demanda sustentável forte. O que vemos são problemas na disponibilidade de aviões. Os fabricantes não conseguem entregar mais aeronaves. Temos um problema estrutural, com alta procura e oferta que não é forte, o que significa que o preço inevitavelmente sobe.

Quando se diz que temos que baixar o preço de passagens administrativamente, isso pode ser feito, mas é um péssimo princípio, porque vai terminar mal. Quando não se deixa o mercado funcionar, a coisa anda mal. Neste momento estamos vendo o problema da Boeing. Estive visitando a Embraer, que é uma companhia fantástica.

Com esse cenário, acabou a era da passagem barata?

Eu diria que sim. A humanidade como um todo aumenta. Vai ter mais gente para voar. As pessoas têm mais apetite por turismo. As companhias têm ainda o desafio de sustentabilidade, de conseguir emissões de carbono zero. Diria que passagem aérea barata só em promoção.

A passagem aérea internacional do Brasil é precificada em dólar. Os preços estão crescendo por conta da oferta limitada. A única forma para o passageiro de lidar com isso é planejar o mais cedo possível sua viagem.

E o passageiro de negócios? A expectativa era que executivos só fizessem reuniões virtuais...

Não é possível fazer negócios a distância. Esse passageiro já voltou. Talvez não tanto como em 2019, mas não sumiu como diziam os profetas da desgraça. Negócio tem que encontrar cara a cara, apertar a mão e vir no samba (executivos da empresa pretendiam fazer uma visita a um ensaio da Portela, no Rio). Não tem como fazer samba por virtual.

O Brasil é o mercado que mais cresce para a TAP?

Sim. Se o Brasil perceber o potencial enorme de turismo, só vai crescer.

Hoje a companhia tem restrições para aumentar a frota em razão do acordo de reestruturação fechado com a Comissão Europeia em 2021. Mas a demanda está aquecida. Como se manter competitivo?

Temos 99 aviões e até o fim de 2025 não podemos aumentar por conta do plano de reestruturação acordado com Bruxelas. Os 91 voos que teremos no Brasil se fazem com essa frota. Hoje, são 84. Vamos continuar a crescer devagar, trocando avião menor e colocando avião maior.

Em razão dos voos regionais, eram aviões de 50, 60 e 80 lugares. Você tira e coloca aviões de 300. Mas a aviação sempre tem restrições. Uma delas é o aeroporto. Mesmo que Latam, United queiram tirar espaço da TAP, não tem como. Não conseguem pousar em Lisboa. Não tem espaço.

Na passagem pelo Brasil, o senhor visitou a Embraer. Fez alguma encomenda?

Não podemos até o fim de 2025. Para depois, estamos avaliando. Temos jatos Embraer e Airbus. Não temos Boeing. Depois de 2025, seria baixo o número de aviões que poderíamos trazer. Seria algo como três, quatro ou cinco. Precisamos de um aeroporto novo para trazer mais turistas.

As restrições podem afetar o interesse pela empresa caso o governo decida privatizá-la?

O tema da privatização não vai acontecer em 2024. As eleições são em março. Depois entra a negociação do orçamento de 2025 e ninguém vai ter cabeça e tempo para pensar nisso. Em 2025 pode entrar a privatização. Mas é preciso ter autorização da Comissão Europeia, de autoridades brasileiras e americanas. Isso leva mais um ano.

Quem comprar já não estará obrigado aos termos do plano de reestruturação. O maior ativo da TAP é o acesso ao mercado brasileiro. O Brasil representa um terço da operação. Ninguém compraria a empresa para pôr em causa o acesso ao mercado brasileiro. Seria matar a galinha dos ovos de ouro.

Quais são os grupos interessados na TAP?

Os grupos que vieram a público são Iberia, Air France KLM e Lufthansa. E tem que ser majoritariamente europeu por causa das regras de controle, mas pode haver participação brasileira, americana ou árabe, desde que o controle da compradora seja da Europa.

Ainda não se sabe se o governo vai privatizar ou oferecer uma fatia do capital ao setor privado. Qual é o melhor modelo?

Há três cenários possíveis. Hoje é uma empresa pública sujeita a regras de empresa pública. A TAP precisa cumprir as mesmas obrigações que o Teatro São Carlos ou a Companhia das Águas. Isso não faz sentido porque a TAP é a única que opera no mercado global.

Um segundo cenário é ser empresa pública e ter regras próprias, como aconteceu até 2014. O terceiro cenário é ser completamente privada. Acho que o Estado manter uma participação faz sentido dada a importância estratégica da empresa. Mas não obrigar a empresa a ser tratada como empresa pública.

Quais são as amarras hoje? É na rotina de compras?

Sim. A cada compra acima de € 5 milhões é preciso pedir autorização ao Tribunal de Contas. E esse valor temos todos os dias. Tenho que manter equipe e estrutura para tratar dessa burocracia. São custos desnecessários.

Como gerir a empresa sem saber se será vendida?

É a preocupação que os trabalhadores da TAP têm. O que falamos é “esquece que há privatização”. Temos que trabalhar como se não houvesse. Primeiro vai demorar muito tempo. E segundo não sabemos se vai acontecer. A melhor forma de proteger o emprego é trabalhar como se não fosse haver privatização.

Como acompanham a discussão sobre o pacote de socorro a aéreas no Brasil? Os parceiros aqui são Gol e Azul...

São fases do mercado. Na Europa, a ajuda (com o impacto da pandemia) foi imediata, em 2020 e 2021. Aqui, as companhias tiveram de aguentar esse processo até agora. Mas é um caminho normal. Confiamos que a gestão de todas elas sabe o que está fazendo.

Qual o potencial do país?

O turismo no Brasil tem todo o potencial para crescer enormemente. Em Portugal, o turismo é 19% do PIB. Aqui, é 7% ou 8%. Não faz sentido. O Brasil não é Rio ou São Paulo. Há maravilhas sem fim. E o europeu não conhece o Brasil. Todas as conversas que temos tido com governantes brasileiros são para aumentar o investimento em promoção do Brasil na Europa.

Quais capitais surpreenderam?

Para 2024, estamos aumentando o número de voos. Em Belém, passaremos de 4 para 5 voos semanais. Brasília, de 6 para 7 voos diários. No Rio, de 13 para 14. Em São Paulo, de 21 para 24. Em Porto Alegre, de 3 para 4. São 11 cidades ao todo. Se tivéssemos mais aviões a dúvida seria fazer mais do mesmo ou novas rotas, como São Luís, Florianópolis e Curitiba.


Fonte: O GLOBO

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