Disparidade entre competitividade na Europa e no Brasil não será corrigida com convocações de jogadores que atuam no país

Disparidade entre competitividade na Europa e no Brasil não será corrigida com convocações de jogadores que atuam no país


Antes de arrancar para receber o passe de Bellingham e marcar o primeiro gol do Real Madrid na final da Supercopa espanhola, Vinícius Júnior se movera alguns metros da ponta para o centro do campo. Fugira da marcação de Araujo, titular da seleção do Uruguai, para vencer com facilidade o francês Koundé, titular na final da Copa do Mundo no Catar.

Rodrygo, antes de oferecer a Vinícius o segundo gol, fez movimento semelhante, desta vez entre Koundé e Christensen, este titular da Dinamarca no último Mundial. O mesmo Rodrygo que, há pouco mais de um ano, colocara o Real Madrid numa final de Liga dos Campeões ao se impor com dois gols em meio a João Cancelo, Ruben Dias, Laporte, Rodri... Na decisão, ambos venceram um Liverpool que, do meio para trás, tinha Thiago Alcântara, Van Dijk, Trent Alexander-Arnold...

Sob o ponto de vista brasileiro, a goleada do Real Madrid sobre o Barcelona, no domingo, pode conduzir a duas abordagens. A primeira, nos lembrar que é até possível achar que o país já teve uma quantidade maior de extraclasses em sua história, mas talento ainda não é o que nos separa de formar uma seleção de elite. O país nunca saiu dessa elite, diga-se.

O outro aspecto é observar contra que classe de jogadores Vinícius e Rodrygo se destacam. Quando se moviam da ponta para o meio, encontravam as costas de meio-campistas como o holandês De Jong e o alemão Gündogan, este último um dos melhores jogadores do melhor time do mundo na temporada passada, o Manchester City. 

É seguro cravar que o Brasil tem pelo menos dois atacantes na elite mundial do jogo porque, em bases semanais, eles competem contra outros atletas de elite. É fundamental ter isto em mente, em especial quando Dorival Júnior, ainda que involuntariamente, reacendeu o debate sobre a presença de jogadores domésticos na seleção brasileira.

Talvez nem seja justo tomar ao pé da letra a entrevista de Dorival ao se apresentar como novo técnico da seleção. Na ocasião, ele abriu portas para mais jogadores de clubes brasileiros nas convocações. Há um papel quase diplomático embutido nas funções do treinador da seleção. O que inclui adotar um discurso de valorização do jogo doméstico. 

Tite e sua comissão eram presenças constantes em partidas dos clubes nacionais, o que raramente se refletia nas convocações. Mas cumpriam um papel de prestigiar as disputas locais, algo que Dorival procurou fazer em seu discurso. A questão é torná-lo uma prática.

A concentração de dinheiro em um grupo restrito de ligas europeias fez destes campeonatos um reduto da elite técnica do jogo. E gerou disparidade entre os ambientes competitivos de lá e daqui. Não é com convocações de jogadores que atuam no Brasil que esta distorção será corrigida. O problema está na ordem econômica internacional do futebol, e isso o técnico da seleção não tem poder para mudar.

Nem é justo decretar que, por definição, jogadores de clubes brasileiros não têm capacidade para atuar pela seleção. Há óbvias exceções que o mercado europeu não absorveu ou até jovens que, por questões humanas, tiveram dificuldades de adaptação. 

O que se coloca é um desafio para qualquer selecionador sul-americano: ao optar entre o destaque de um campeonato nacional de Brasil, Uruguai ou Argentina, e um jogador em evidência numa grande liga europeia, é impossível não levar em conta que este último sobressai num ambiente competitivo mais desafiador, enfrentando a real elite do jogo. E, para ganhar uma Copa do Mundo, será preciso vencer esta mesma elite.


Fonte: O GLOBO

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