Não há futuro sem equidade racial

Não há futuro sem equidade racial


Até por causa das cotas, tem sido muito destacado o significativo (mesmo que insuficiente) crescimento da proporção de negros no ensino superior. Em termos quantitativos, porém, a mais vigorosa expansão nas três últimas décadas aconteceu no ensino médio. Entre 1992 e 2022, o percentual de autodeclarados pretos ou pardos de 15 a 17 anos nesta etapa aumentou de 9% para 72%. 

Entre a população branca da mesma faixa etária, a variação foi de 27% a 81%. A distância, portanto, caiu de 18 para 9 pontos percentuais, mas a meta a ser alcançada aqui é de 100% de matrícula e conclusão em todos os grupos.

A melhoria da escolaridade média é percebida também entre adultos. Dados do Relatório das Desigualdades Raciais (2022) do Grupo de Estudos Multidisciplinares de Ação Afirmativa (Iesp/Uerj) – elaborados por Luiz Augusto Campos, Rogério Barbosa, Jheniffer Ribeiro e João Feres Júnior – mostram que, entre 1987 e 2021, a proporção de pretos, pardos e indígenas com ao menos ensino médio completo aumentou de 9% para 54% na faixa de 18 a 65 anos. De novo, uma melhoria significativa, mas insuficiente para igualar o percentual de brancos e amarelos (69%).

O movimento, porém, é bem menos positivo em termos de qualidade. Em capítulo do recém-lançado livro “Números da discriminação racial”, Gerrio Barbosa, Danilo Ferreira, Erivelton Nunes, Alysson Portella e Michael França mostram que a desigualdade racial nos indicadores de aprendizagem aumentou na educação básica entre 2007 e 2021, mesmo na comparação apenas de alunos com características socioeconômicas semelhantes.

A diferença, em favor dos alunos brancos, também cresce ao longo das séries, e pode ser percebida tanto em termos de aprendizagem, quanto em indicadores de evasão e repetência. Hoje, felizmente, o acesso ao primeiro ano do ensino fundamental é praticamente universalizado. A partir daí, no entanto, as trajetórias variam muito, conforme mostra estudo de José Francisco Soares, Maria Teresa Gonzaga Alves e José Aguinaldo Fonseca, já citado aqui na coluna. 

Por exemplo, entre meninas brancas de alto nível socioeconômico, 78% conseguiam completar o fundamental sem repetência ou evasão. Para meninos negros de baixo nível socioeconômico, esta proporção caí a apenas 20%.

Precisamos avançar em qualidade, com redução de desigualdades, o que exige políticas equitativas, que deem especial atenção aos alunos que mais precisam de apoio. O reconhecimento de injustiças históricas deveria ser suficiente para convencer toda a sociedade disso. Mas há, entre tantos outros argumentos, também o econômico.

Conforme destacou há duas semanas Ricardo Henriques em sua coluna no GLOBO, a transição demográfica ocorre em velocidades distintas no Brasil. E, para nos adequarmos a uma sociedade cada vez mais envelhecida, a conta só vai fechar se formos capazes de aumentar a produtividade média do trabalhador. Isso demanda, entre outras coisas, mais e melhor investimento por estudante.

Ocorre que, por conta dos ritmos distintos de transição demográfica no país, a infância é, cada vez mais, preta, parda e indígena. Esses grupos representam 58% dos brasileiros de 0 a 17 anos, proporção que cai a 48% na população com 60 anos a mais. Seja por uma questão de justa reparação histórica ou por necessidade econômica, combater as desigualdades raciais desde a educação é tarefa urgente e fundamental.


Fonte: O GLOBO

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