Após maior apagão desde 2009, governo pede investigação sobre as causas

Após maior apagão desde 2009, governo pede investigação sobre as causas

Ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, não descarta 'dolo'

Problemas iniciados em linhas de transmissão no Nordeste e no Norte interromperam ontem o fornecimento de energia em 25 estados do país e no Distrito Federal, parcial ou totalmente, no maior apagão no fornecimento de eletricidade no Brasil desde 2009 — quando se considera abrangência territorial e corte de carga. O único estado não afetado foi Roraima.

Ao todo, as regiões afetadas correspondiam a cerca de 25% da carga total do Sistema Interligado Nacional (SIN) no momento da falha, que teve início às 8h31. Um terço dos consumidores foi atingido, disse o ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira.

Nos cálculos dele, isso seria equivalente a 27 milhões a 29 milhões de unidades consumidoras. Ele pediu para a Polícia Federal (PF) e a Agência Brasileira de Inteligência (Abin) que investiguem se houve sabotagem.

Silveira afirmou que um apagão como o de terça-feira é fenômeno extremamente raro e que só seria observado com a ocorrência de dois eventos concomitantes. Ele comparou o modelo de funcionamento do setor elétrico a uma estrada com duas pistas, na qual o consumidor só percebe falhas quando ocorrem problemas nas duas ao mesmo tempo.

— O que aconteceu hoje, é importante dizer, é extremamente raro, e absolutamente nada tema a ver com o planejamento do sistema e a geração de energia — disse.

O fornecimento de energia foi normalizado às 14h49, de acordo com o governo. Mais de doze horas depois do início do apagão, o Executivo ainda não tinha uma explicação clara sobre o que causou a falha.

— Não poderia deixar de destacar que o ocorrido de hoje não tem nada a ver com o suprimento energético e a segurança energética do Brasil — disse Silveira.

Sobrecarga no Ceará

O ministro afirma que um dos incidentes que levou ao apagão ocorreu no Ceará por causa de uma sobrecarga na transmissão, o que fez o sistema entrar em colapso na região. O que exatamente ocorreu no Ceará, em qual localização e quais empresas envolvidas não foi esclarecido.

A linha é privada, e Silveira disse que é cedo para divulgar o nome do proprietário. O secretário de Energia Elétrica, Gentil Nogueira, disse que diversas empresas operam na região, citando especificamente a Chesf — subsidiária da Eletrobras, cuja privatização foi duramente criticada na entrevista de Silveira. Segundo ele, os órgãos reguladores têm até 48 horas para divulgar as primeiras análises.

O diretor-geral do Operador Nacional do Sistema Elétrico, Luiz Carlos Ciocchi, disse ao Valor que é difícil saber exatamente o que aconteceu. Segundo ele, não é uma única linha, não é uma única subestação, mas um conjunto de linhas e geradores.

O governo não informou onde teria havido o segundo problema, mas o ministro mencionou que um dos locais sob investigação é uma subestação de energia em Anapu (PA), próxima a usina de Belo Monte.

Funcionários de empresas e repartições públicas do Paraná no escuro durante apagão desta terça-feira — Foto: Dirceu Portugal/Fotoarena/Agência O Globo

Uma hipótese é que a falha nessa linha tenha desencadeado um efeito em cascata, afetando uma subestação em Imperatriz, no Maranhão, próximo à divisa com o Pará.

Isso explicaria porque a usina de Tucuruí foi atingida pela falha. Com exceção de Roraima, que não faz parte do sistema nacional de energia, os estados do Norte ficaram completamente sem luz.

Software de proteção

Com as falhas, um sistema chamado de Erac (esquema regional de alívio de carga), uma espécie de software de proteção, atuou e cortou o fornecimento de forma escalonada. O Erac é um sistema que desliga o fornecimento de energia para evitar sobrecargas e danos maiores.

Porque a geração de energia precisa ser bastante similar à demanda, não pode haver nem excesso e nem falta, sob o risco de colapso e perda de equipamentos.

No momento do apagão, as regiões Norte e Nordeste estavam exportando energia para o Centro-Sul. Isso porque há uma abundância de fontes renováveis naquelas regiões, especialmente usinas eólicas. Dessa forma, foi preciso cortar a energia que faltava no Centro-Sul e a que sobrava no Nordeste. Por isso, a geração de eólicas despencou 80%.

O Erac, então, cortou a energia para as regiões Sudeste, Centro-Oeste e Sul. O sistema, então, dividiu o país em dois, separando Nordeste/Norte de Sudeste/Centro-Oeste/Sul.

Apesar da explicação técnica, o ministro de Minas e Energia pediu investigação criminal. Ele disse que essa decisão foi tomada pela sensibilidade do sistema e por conta dos atentados a torres de transmissão em janeiro após atos golpistas em Brasília.

— Vamos encaminhar tanto à PF quanto para a Abin a instauração de procedimentos para apurar eventuais dolos nesse ocorrido de hoje (ontem) — afirmou.

Para Joisa Dutra, pesquisadora da FGV e ex-diretora da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), não é a melhor alternativa:

— Não faz sentido colocar PF e Abin no caso, porque os órgãos do setor elétrico já são preparados para identificar qualquer suspeita de crime ou sabotagem.

O ex-diretor da Aneel Edvaldo Santana disse que o apagão não foi motivado por gargalos:

— Se é falha de equipamento ou humana, a folga de capacidade deveria evitar a propagação da falha para todo Brasil.

(Colaborou Vinicius Neder)


Fonte:O GLOBO

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