Caso de coronel russo é o mais recente de desafio à censura de Moscou; veja outros

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Repressão interna contra vozes dissidentes na Rússia em relação à guerra na Ucrânia é forte e pode levar a até 15 anos de prisão

Porto Velho, RO -
Desde que o presidente Vladimir Putin ordenou a invasão da Ucrânia, no dia 24 de fevereiro, a posição do Kremlin tem sido ratificada pela mídia estatal russa, endossando a repressão interna contra dissidentes que se opõem à guerra. Isso não garantiu, no entanto, que algumas vozes divergentes tenham desafiado a censura russa publicamente.

O caso mais recente foi o do coronel aposentado Mikhail Khodaryonok que, em uma participação em um programa da TV estatal russa, criticou o que a Rússia chama de “operação militar” em território ucraniano e afirmou que o país está geopoliticamente isolado do mundo.

— A principal deficiência de nossa posição político-militar é que estamos em plena solidão geopolítica. E, embora não queiramos admitir, praticamente o mundo inteiro está contra nós. Precisamos sair dessa situação — afirmou o coronel ao programa 60 Minutos, no Rossiya-1, apresentado por Olga Skabeyeva, uma das jornalistas mais pró-Kremlin da TV russa.

Em março, Putin sancionou uma lei que prevê pena de até 15 anos de prisão se forem divulgadas informações que busquem “desacreditar” as Forças Armadas russas e de divulgar o que o Kremlin considere como “informações falsas” sobre a guerra.

Semanas depois, o presidente russo também alertou que limparia a Rússia da “escória e de traidores” que acusa de trabalhar secretamente para os EUA e seus aliados.

— Qualquer povo, e particularmente o povo russo, sempre será capaz de distinguir os patriotas da escória e dos traidores e cuspi-los como um mosquito que acidentalmente voou em suas bocas — disse o presidente russo à época.

Segundo dados do site de monitoramento independente russo, o OVD-Info, mais de 15 mil detenções já foram realizadas desde o início dos conflitos.

Confira abaixo mais casos de desafio à censura de Moscou:
 
Programação interrompida

Em meados de março, a jornalista Marina Ovsyannikova ficou conhecida mundialmente após interromper um telejornal estatal russo em protesto contra a guerra na Ucrânia, no Canal 1. Na ocasião, a mulher entrou no estúdio com um cartaz em que se liam frases como “não acreditem na propaganda” e “eles estão mentindo para vocês”. 

Durante a invasão ao estúdio, o microfone da apresentadora ainda captou gritos de “parem a guerra”. A cena ficou no ar durante vários segundos até que o canal interrompesse o protesto.

Marina Ovsyannikova com cartaz contra a guerra na Ucrânia durante jornal do Canal 1, da Rússia Foto: HANDOUT / AFP

Antes do protesto ao vivo, Marina gravou uma mensagem em vídeo e postou no Facebook, contando que seu pai é ucraniano e a mãe é russa e dizendo ter vergonha de ter participado da “propaganda” em apoio ao governo feita pela emissora ao longo dos anos.

Após o ocorrido, Marina foi detida e condenada a pagar 30 mil rublos (R$ 1.430) por violar atos relativos a “eventos públicos não autorizados”. No entanto, a jornalista ainda está sujeita a punições mais duras, previstas pela lei adotada pelo Kremlin contra “desinformação” ligada ao conflito. Caso seja enquadrada em algumas das novas regras, poderá ser condenada a até 15 anos de prisão.

Apesar do risco, a redatora de 43 anos afirmou que vai continuar na Rússia, onde foi contratada pelo jornal alemão Die Welt como correspondente internacional.
 
Rompimentos com o Kremlin

A guerra também trouxe perdas na cúpula de Putin, devido às opiniões contrárias sobre a ofensiva militar na Ucrânia. É o caso do ex-vice-primeiro-ministro Arkady Dvorkovich, e o enviado do governo russo para o Clima, Anatoly Chubais.

Em março, Dvorkovitch concedeu uma entrevista à revista americana Mother Jones, em uma matéria onde 36 enxadristas de todo o mundo opinavam sobre a guerra. Na ocasião, ele afirmou acreditar que a Rússia havia começado o conflito e que seus pensamentos estavam “com os civis ucranianos”.

Após a repercussão da entrevista e de críticas dentro da ala política, Dvorkovitch deixou o cargo de presidente da Fundação Skolkovo, dedicada à inovação tecnológica no país e apoiada pelo Estado.

— Ele fez sua escolha — disse o senador Andrei Turchak, secretário-geral do partido do governo. — Isso é uma verdadeira traição nacional.

Dvorkovitch foi o principal assessor econômico do então premier Dmitri Medvedev entre 2012 e 2018 e presidiu o comitê organizador da Copa do Mundo de 2018. Também presidente da Federação Internacional do Xadrez, era uma das raras vozes dentro dos altos escalões do governo russo a tecer críticas ao conflito na Ucrânia e mesmo a usar a palavra “guerra” em seus comentários.

Posteriormente, o assessor de Putin para o Clima, Chubais, renunciou ao cargo e deixou o país citando sua oposição à guerra.

Chubais, de 66 anos, era um dos poucos integrantes do grupo responsável pelas reformas econômicas da década de 1990 que havia permanecido no governo e mantinha laços estreitos com autoridades ocidentais. Segundo o Kremlin, Chubais teria deixado o cargo por vontade própria.

Conhecido como o arquiteto das privatizações da Rússia na década de 1990, após o colapso da União Soviética, Chubais deu a Putin seu primeiro cargo no Kremlin em meados dos anos 1990 e inicialmente saudou sua ascensão ao poder no final daquela década.

Sob Putin, Chubais ocupou cargos importantes em grandes empresas estatais até que o presidente o nomeou enviado para o desenvolvimento sustentável em 2021.
Dissidência nas escolas

O material, segundo a Reuters, consiste em guias que mostravam os soldados russos que lutam na Ucrânia como heróis, que afirmavam os governantes da Ucrânia fizeram acordos com pessoas que colaboraram com os nazistas da Segunda Guerra Mundial, que o Ocidente tentava espalhar discórdia na sociedade russa e que os russos devem permanecer unidos. Também eram compartilhados links para vídeos de discursos de Putin e curtas-metragens.

A iniciativa mostra como o Estado russo está ampliando os esforços de propaganda até mesmo fora da mídia estatal.

No entanto, alguns professores e alunos têm se mostrado contrários à guerra e vêm enfrentando as pressões do Estado, com multas, processos judiciais e a perspectiva de perderem seus empregos.


Fonte: O GLOBO

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